Por ter sido um dos maiores Sismos das últimas 4 decadas desde que há registo, com epicentro na ilha indonésia de Sumatra, que gerou um maremoto também conhecido por Tsunami, onde atingiu vários países do Sudeste Asiático. Espalhando o caos, e onde já se fala em mais de 60.000 mortes, 30 mil desaparecidos e milhares, milhares de feridos, e por achar que este texto do Jornal Público é de grande importância, passo a publicar.
Desde já os meus agradecimentos ao José Manuel Fernandes e ao Jornal Público.
Segunda-feira, 27 de Dezembro de 2004
O primeiro grande terramoto, acompanhado por um maremoto, a impressionar o Ocidente civilizado e a ser objecto de estudo ocorreu há quase 250 anos: foi o de Lisboa, a 1 de Novembro de 1755. Na Europa do Iluminismo, onde a ciência ganhava um protagonismo crescente, a calamidade de Lisboa - as igrejas que ruíram quando os fiéis rezavam no seu interior; a vaga gigantesca que invadiu o Tejo e subiu até aonde hoje se situa o Marquês de Pombal; os incêndios que se seguiram - abalou as convicções dos que acreditavam que a ciência podia não só explicar tudo, como permitir à Humanidade dominar a Natureza.
Pouco mais de um século depois, em 1883, a explosão do vulcão de Krakatoa - localizado exactamente no extremo oposto da ilha de Sumatra por comparação com o epicentro do terramoto de ontem - provocou o maior tsunami de que há registo. As vagas atingiram os 40 metros de altura e, mesmo amortecidas, deram várias voltas ao planeta, tal o impulso inicial. Nessa altura já existia uma rede telegráfica mundial, incluindo cabos submarinos, o que permitiu que a tragédia e as suas consequências fossem estudadas à escala global.
De então para cá aprendemos imenso sobre a forma como funciona o planeta, percebemos que este é composto de placas que "flutuam" sobre um interior quente e fluido que as atira umas contra as outras. Assim se formam as cadeias de montanhas, despertam os vulcões e, sempre que a energia acumulada nas zonas fricção é maior, esta liberta-se subitamente de forma violenta, originando fenómenos de magnitude variável, desde os micro-sismos que só os sismógrafos registam até terramotos como o de ontem, o quinto maior desde que existe registo cientifico.
Tudo isso sabemos - só não sabemos o momento em que essa energia se vai libertar, a terra vai tremer ou, no fundo de um oceano, uma fenda se vai uma onde gigantesca. O que quer dizer que não podemos prever tais catástrofes. Podemos, devemos, preveni-las. Estar preparados para monotorizar a formação de um tsunami e, assim, evacuar as zonas onde poderá ter maior impacto, algo que ontem não aconteceu. E construir as nossas cidades de forma a evitar que o inevitável - uma manifestação violenta de que a Terra tem vida própria - se transforme em catástrofe de dimensões trágicas, sobretudo no que diz respeito à perda de vidas humanas.
Portugal, que está a iniciar um ciclo de comemorações dos 250 anos do terramoto de 1755 devia aproveitar a oportunidade para lançar, sobre este tema, um grande debate. Para conhecer melhor em que estado estão os edifícios das zonas mais sensíveis. Para realizar campanhas de prevenção sobre o mais correcto comportamento em situação de forte abalo sísmico. E para revisitar as normas de construção em vigor, assim como os planos de emergência dos serviços de protecção civil.
Repetimos: ninguém pode adivinhar a chegada de um terramoto. E ainda é difícil estabelecer relações entre fenómenos sísmicos mesmo quando estes ocorrem na mesma zona. Não podemos pois descansar pelo que, sem alarmismos, é bom recordar que o Continente que sentimos há bem pouco um sismo de 6,4 graus na escala aberta Richter. Ora, como nos diz nesta edição o sismólogo Rolando Armijo, a 25 de Julho ocorreu na zona do terramoto de ontem, mas a 600 km de profundidade, um outro de 7,3 de magnitude (o de ontem atingiu os 8,9). "Anunciou ele o terramoto de ontem? Talvez, mas é difícil de provar", acrescentou o sismólogo. Não pensemos pois que estamos a salvo - o importante é prevenir.
Por JOSÉ MANUEL FERNANDES
"Podemos Esperar Grandes Réplicas" Por ALEXANDRA SCHWARTZBROD
Segunda-feira, 27 de Dezembro de 2004
Formado em Física, Rolando Armijo é especialista em tectónica no Instituto da Física do Globo de Paris. Entre outros projectos, foi responsável científico do programa franco-turco de cooperação sobre o risco sísmico na região de Istambul. Para além de "grandes réplicas", diz, podem esperar-se mesmo "rupturas múltiplas de outras falhas" no Sudeste Asiático, onde um dos maiores sismos já registados matou ontem pelo menos dez mil pessoas.
LIBÉRATION - Como é possível que os peritos não tenham conseguido prever uma catástrofe destas?
ROLANDO ARMIJO - É típico deste fenómeno: nunca vemos terramotos chegarem. Podemos prevê-los num sentido alargado, sabemos que certas regiões são mais sensíveis do que outras porque já foram vítimas de um sismo. Mas não podemos dizer quando nem com qual amplitude. Todo o mundo sabe, por exemplo, que um dia vai haver um "big one" no Oeste dos Estados Unidos ou no Japão. Mas não podemos fazer nada, a não ser planear um máximo de construções antisísmicas. São fenómenos muito complicados. Imaginemos que estamos sob a tempestade e que o raio cai: mesmo se compreendermos perfeitamente o sistema do raio, somos incapazes de dizer onde é que vai cair. Com os terramotos é idêntico.
P. - Como explica este sismo?
R. - Os megasismos produzem-se sempre nas fronteiras das placas. Normalmente, a placa que sustém Sumatra (a placa da Sonda) cobre de forma continua a placa indo-australiana, é o que nós chamamos uma zona de "subducção". Ali, essa sobreposição bloqueou-se bruscamente na superfície, provocando o tremor de terra que atraiu a corrente da maré. O centro encontrava-se a 10 ou 20 quilómetros de profundidade mas a ruptura teve de se propagar na direcção do fundo e até à superfície para puxar uma tal corrente da maré. Em comprimento, a falha deve estender-se por várias centenas de quilómetros, com o epicentro situado ao nível das ilhas Andaman (Índia).
Os maiores sismos estão sempre ligados a este fenómeno de sobreposição. Ao longo do último século, só dois sismos ultrapassaram os 9 graus na escala de Richter: no Chile, em 1960 (9.5) e no Alasca em 1964 (9.2). O sismo de ontem, que situamos entre os 8 e os 9 graus na escala de Richter, é assim um dos maiores registados em uma centena de anos.
P. - Muitos na região temem réplicas nos próximos dias...
R. - Se eu lá estivesse, ficaria de facto muito inquieto. Estas falhas falam umas com as outras. É uma zona geológica viva e passam-se lá muitas coisas. Podemos por isso esperar por grandes réplicas e mesmo por rupturas múltiplas de outras falhas, excitadas pelo distúrbio na região. Este ano, já tinha havido um sismo, muito mais profundo, nesta zona, a norte da ilha de Sumatra. Foi a 25 de Julho, a perto de 600 quilómetros de profundidade, um sismo de 7.3 na escala de Richter. Anunciou ele o terramoto de ontem? Talvez, mas é difícil de provar.
Exclusivo PÚBLICO/ Libération
TSUNAMI